No meu tempo

    A fila estava grande.. A menina bonita não desgrudava os olhos do celular. A todo momento, seus dedos escreviam mensagens. Ela sorria,  o ar era de total expectativa.

 O atendimento estava bem demorado.  Começavam as reclamações de praxe. Os desmandos do governo (seja qual for), do preço do supermercado e da realidade de uma farmácia em cada esquina. As lamúrias eram cada vez maiores. E a menina bonita continuava em seu diálogo, agora mais tranquila.

 A voz grave, acostumada aos lamentos, sentencia: "No meu tempo não tinha essas coisas e éramos mais felizes. Tínhamos mais contato com as pessoas".

 Como assim? Quem determina? Como comparar? Volto no tal tempo...

 Para um recado urgente, eu procurava o orelhão mais próximo.  Se pudesse ligar a cobrar era um ganho, mas se necessitasse de ficha... Ah! era rezar para encontrar uma jogada na bolsa ou comprar na banca de jornal. Esta vendia apenas jornais e revistas, hoje é um mundo de ofertas e produtos.

 Para enviar um texto urgente, a coisa mais moderna era o fax. Mas que precisava logo "tirar uma  xerox", para não perder a mensagem, que apagava com o tempo. E como era caro tirar uma cópia!

 E a internet?  Nossa!  É impossível um jovem hoje imaginar a cena do envio de um  um e-mail. A conexão fazia um longo ruído e nesse instante a tensão predominava até conseguir conectar ao provedor. Ah! sem esquecer, que nesse momento o telefone da casa ficava ocupado  e a conta telefônica se tornava um terror. O melhor era usar na madrugada, nos sábados depois das 14 horas e domingo, aí o impulso era mais barato. O telefone tinha  tanto valor, que era declarado no imposto de renda. E, no caso de morte, fazia parte do inventário de bens.

  Para a menina bonita, tudo isso é história. Claro! A minha história.

 Mas, o meu tempo é todo dia. Vou encarar as mudanças de forma adulta e responsável.Por que  reclamar das coisas que estão na minha frente?  Tenho e devo participar de tudo. O desafio da tecnologia está aí. É direito meu não "caçar Pokémon", mas qual o motivo de ficar irritado como quem  gosta?

 Será que nesse tão citado "meu tempo" eu procurava interagir mais com as pessoas, eu conversava mais? Eu não me isolava rabiscando diários? Não ficava trancada no quarto ouvindo meus discos? Que revolução quando surgiu o gravador pequeno e eu podia escutar tudo em fita cassete, e ao mesmo tempo caminhar.


 Vou parar por aqui. Quero a revolução da alma. Quero ética. Quero solidariedade. Quero escrever diariamente a minha história. Do meu tempo, que é hoje.


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