Ainda escrevo cartas
“Cartas de amor são escritas não
para dar notícias,
não para contar nada,
mas para que mãos separadas se
toquem
ao tocarem a mesma folha de papel.”
Rubem
Alves
A distância me lembra cartas... A saudade me faz pensar em envelopes e
cartões, sentimento traduzido no desenho do texto.
Emoção. E uma incontrolável vontade
de conversar, partilhar, saber e encontrar. Talvez seja essa a motivação. A definição
de Rubem Alves parece desvendar o meu segredo.
Na infância, por mais cadernos de
caligrafia que fizesse não teve jeito,
minha letra sempre foi horrível. Legível, mas feiosa. E o texto parecia gritar
dentro de mim. Muitas vezes recorri à máquina de escrever, apesar da poesia de Quintana alertar:
"E depois, como pode ser íntima uma carta escrita a
máquina? Traz ideia de distância, de pequena
mas intransponível distância…
como um beijo dado de máscara".
A professora de Português que
ensinou como preencher um envelope, destinatário, remetente... Me senti
poderosa com essa lição.
Na adolescência aguardava ansiosamente a
chegada do carteiro, que trazia preciosas mensagens dos amigos e primos distantes. E
do garoto carioca, Alaor era o seu nome. Pensávamos que éramos namorados.
Afinal trocávamos frases de amor, que chegava em um papel arrancado de um
bloco de redação da escola.
Para tentar dar um toque especial, muitas vezes, recortava imagens de
revistas para ilustrar e mostrar um esmero diferenciado.
Na juventude, a pequena Olivetti me salvava. As teclas davam o ritmo
descompassado do meu coração. Participava de turmas de poesias, de troca de
livros, com gente que simplesmente gostava de se corresponder. Penso que essa atividade foi
o embrião dos grupos de whatsApp, uma febre dos nossos tempos.
Hoje a caixinha de correspondência fica abarrotada de contas, propagandas
e folhetos de disque alguma coisa. O frio no estômago pela notícia é substituído
pelo terror ao receber a fatura do cartão de crédito.
A correspondência faz sonhar. Cartas são documentos do tempo. O cinema, o teatro
e a literatura também abordam a temática. Dora, personagem de filme Central do
Brasil mostra a crueldade do analfabetismo no País e faz seu ofício
escrevendo no lugar de pessoas precisavam falar com seus parentes distantes.
Ainda escrevo cartas abarrotadas de carinho, mas para pouquíssimos
destinatários. Sou apaixonada pelas Epístolas dos apóstolos dirigidas às primeiras comunidades cristãs. Brinco de
criança e me emociono ao ler uma cartinha para o Papai Noel.
Com a correria diária, quem se daria ao luxo de parar para ler ou
escrever a tal missiva? Que magia oferece o desafio do papel em branco, que
será acarinhado de confidências?
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