E por falar em biografia, tenho algo a dizer


             Defendo com veemência que pessoas importantes para a cultura nacional tenham sua história artística registrada. Questionamos tanto que o Brasil não tem memória e o que fazemos para garantir que as novas gerações conheçam nossas raízes?
            Sempre fui apaixonada por histórias. Desde garota, meu avô, Antonio de Carvalho, desenhava lindas noites contando, mostrando e apresentando personagens maravilhosos. Falava da sua terra natal, Guarda, em Portugal, de fatos políticos e da memória afetiva.  Sua frase famosa nos encontros familiares era: “Minha vida bem contada é um romance..
            Tenho certeza de que a sua presença foi um dos principais motivos de minha escolha. Fiquei praticamente dez anos debruçada nas histórias das mulheres que participaram do início do Rádio, no Rio de Janeiro e São Paulo. Vivi e vivenciei lindas trajetórias, tristes despedidas e preconceitos escancarados. A pesquisa foi, basicamente, realizada consultando a coleção de material publicado dos anos 20, 30 e 40.
            Passei longos dias nas bibliotecas folheando revistas raras e um mundo novo ia se abrindo em minha frente.  Ia descobrindo um lindo material que precisava ser agregado para não se perder, vivenciando uma época, costumes, e  padrões.
            Durante todo esse tempo, acompanhei, como em um folhetim, o início da carreira, as dificuldades, o auge da fama, a falta de convites para apresentação, a decadência... Muitas artistas ficaram no esquecimento, outras tiveram o reconhecimento do público e poucas, o da história.
            Eu senti a necessidade de contar, igual ao meu avô, as histórias dessas mulheres. Não me preocupei com segredos trancafiados, mas eu queria resgatar nomes que serviram de exemplos importantes para a cultura brasileira.
            Em 1993 tive um encontro Carmélia Alves, Rainha do Baião. Ao saber do meu projeto ela me abraçou com força, agradeceu e deu o seguinte depoimento: “Comecei em 1940, tenho 53 anos de janela, trabalhando pela música popular brasileira. São anos de memória que precisam ser resgatados. Por ter vivido muito tempo na Europa podemos ensinar, porque aprendemos no berço da civilização. Ninguém está querendo contar vantagens, isso é besteira, nunca liguei para isso. O meu espaço é meu. O que eu tenho que fazer, eu faço. E sei como fazer. Quero mostrar para a juventude tudo o que se passou na nossa época e que não pode morrer. E, se a gente não ficar contando, tudo vai se diluindo e daqui a pouco se apaga. Num país que não tem memória é muito fácil isso acontecer”, conclui Carmélia. [1]
            Tenho certeza que escrevi respeitando cada artista citada. Lancei meu livro De passagem pelos nossos estúdios em 2010. Sei que ele foi bem aceito pela comunidade acadêmica, elogiado em vários programas de rádio e televisão. E serve de fonte para novos estudos.
            Para aqueles que defendem que o escritor quer ficar rico, lamento afirmar que não é verdade. O trabalho foi publicado pela editora Leopoldianum, UniSantos, com o valor de capa de R$25,00. Posso afirmar que ninguém ganhou dinheiro com o livro, mas reafirmo o orgulho de fazermos parte de um grupo que preserva a história e cultura brasileira.
            Um país só poderá ser realmente grande quando souber valorizar seus filhos, resgatando a dignidade do ser humano, e se importar, realmente, com a cultura de seu povo. Que a história de nossos artistas sirva de incentivo e estímulo para o nosso crescimento





[1] TESSER, Tereza Cristina. De passagem pelos nossos estúdios: a presença feminina no início do Rádio no Rio de Janeiro e São Paulo, 1923/43. Editora Leopoldianum, Santos, SP, 2
   

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