Encontro com Dom Paulo

  1980. Saindo das comunidades de base da Igreja Católica, mais precisamente  do grupo de jovens da Basílica do Embaré, eu entrava no mundo universitário repleta de sonhos e ideais. A base de minha formação foi dada pelo Frei José Luiz Viana, ou simplesmente o" Zé  do Embaré".

  Eram anos difíceis. a abertura política começava lentamente. Os primeiros meses do curso de Jornalismo desvendavam conceitos e mexiam com os meus ideais de cidadania.

  Lembro que logo entrei no movimento estudantil, participando do Diretório Acadêmico. Tudo era uma grande novidade. Até que surgiu a primeira greve pelo congelamento das mensalidades. O slogan: "1980, e nenhum centavo a mais".

    Organizamos dentro da escola uma vigília, palavras de ordem, cartazes e até um ato religioso, com a participação de várias lideranças. Tenho ainda um recorte do jornal Cidade de Santos, que mostrava Esmeraldo Tarquínio ao meu lado. Foram dias preocupantes.

    Agora dou risada, mas com certeza eu estava me achando uma grande revolucionária. Os alunos ficaram "acampados" nas salas de aula e tudo começou a ficar muito intenso e as negociações tensas. Um impasse que parecia não ter fim.

    Nesse movimentos tomamos várias decisões de luta. Na minha ingenuidade resolvi falar com o Dom Paulo Evaristo Arns, para que ele intercedesse por nós.

     Com a ousadia do jovem idealista e sem medo, um grupo de quatro pessoas. saiu de Santos para falar com o Cardeal. Sem marcar hora, sem entender bem o motivo, seguimos para São Paulo. Nos apresentamos.  Ela perguntou quem queria falar e eu respondi... sou Tereza Cristina, sou Igreja. A secretária olhou meio ressabiada e pediu que aguardássemos...

     Não esperamos muito e aí chegou aquele lindo homem. Lembro que a primeira coisa que reparei foi no seu sorriso e na voz tranquila. Ele nos ouviu... ficamos de mãos dadas. As recordações aparecem cortadas... como em filme velho, preto e branco. Ficamos um tempo com ele e voltamos para a Cidade. E tudo foi resolvido. Não tenho clareza se foi a nossa conversa que mudou o panorama. Pouco importa. Mas ele nos deu atenção.

     Até hoje guardo o calor de suas mãos envolvendo as minhas. O carinho com que ele escutou nossas lamentações. A paciência em prestar atenção numa juventude sonhadora e que tinha certeza que iria mudar o mundo.

    Hoje, penso na maluquice que fizemos. Tantos problemas mais graves ele intermediou, quantas lutas em defesa dos oprimidos ele vivenciou. E ele nos deu voz.

     Desse dia em diante acompanhei toda a sua trajetória. Como fiquei indignada ao ler "Brasil Nunca Mais", uma grito contra a injustiça e a tortura.

     A história de Dom Paulo sempre me comoveu. Ele tinha a coragem dos justos. Um homem que fez de sua fé um grito pelos oprimidos.

    A lágrima cai sem defesa. Me despeço com carinho e o eterno agradecimento por ouvir a meninada que acreditava e lutava por um País mais fraterno. Obrigada, Dom Paulo, "nosso  grande amigo". Obrigada por ouvir aquela jovem menina determinada, que sonhava, e ainda sonha, mudar o mundo.




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